Artigo publicado na versão impressa da edição de 12 de setembro de 2011:
A polêmica acerca da decisão judicial que autorizou a conversão de união estável homoafetiva em casamento, o primeiro em Limeira entre duas pessoas do mesmo sexo, reacende o debate sobre como a omissão legislativa de nossos representantes dá margem à radicalização de discursos.
Tive a oportunidade de ler os dois posicionamentos, o do Ministério Público (MP), contrário ao casamento homossexual, e a decisão do juiz, em sentido oposto.
Ouvi comentários críticos ao parecer da Promotoria, mas o posicionamento é simples e bem fundamentado.
Como guardião do cumprimento das leis, o MP se opôs, porque não está prevista em nossa legislação a possibilidade de casamento civil entre pessoas do mesmo sexo.
Não há argumento religioso algum na tese (e, convém lembrarmos, casamento civil é diferente de casamento religioso); trata-se de uma peça técnica e legalista.
Se quiserem adjetivá-la de rigorosa, podem fazê-la, mas a fundamentação é respeitável.
O juiz Mário Sérgio Menezes, chamado a resolver difícil questão jurídica, mas ciente de seu ofício, faz reflexão mais ampla.
Disse ele que, para o caso, que envolve direitos fundamentais, é pouco uma interpretação “tampão”.
O magistrado entendeu que o Estado, nos últimos anos, passou a dar atenção aos homossexuais em vários campos (previdenciário, securitário, possessório, entre outros), e lembrou que o Judiciário cumpre a missão de zelar pelos direitos fundamentais do cidadão e precisa dar solução às pendências, conforme as ferramentas jurídicas disponíveis “sem perder os rumos da sociedade contemporânea”.
Muitos são contrários ao casamento civil de pessoas do mesmo sexo e, portanto, às decisões judiciais que o autorizam.
No entanto, o Judiciário só está analisando a questão, assim como em muitas outras áreas, porque, conforme o MP sustenta, não há leis que prevejam o que os casais pedem.
Na ausência legislativa, ir aos tribunais é a única solução para o reconhecimento de um direito.
No Congresso, o debate sobre a questão, assim como o tema aborto, ainda é marcado pelo aspecto dogmático.
As bancadas religiosas são numerosas, e têm força. Deputados e senadores não ousam levar o assunto adiante porque, decididamente, isso representa comprar briga com segmentos fortes e que rendem votos.
O problema é que, enquanto o Congresso não debate, a consequência é que os impasses são levados para o Judiciário, injustamente acusado de legislar por, simplesmente, ser chamado a preencher a lacuna legislativa.
Se os próprios juízes, como bem assinalou Menezes, não podem perder de vista os rumos da sociedade moderna, passou da hora de o Congresso fazer o mesmo.
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