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segunda-feira, 28 de março de 2011

Sujou o projeto, não a ideia

Texto do jornalista publicado na coluna na versão impressa da edição de 28 de março de 2011:

A Lei da Ficha Limpa tem um mérito que ninguém lhe tira.

Ao contrário da maioria das demais leis, ela veio pela iniciativa popular: nasceu, ganhou força e foi aprovada vinda das ruas.

Seu objetivo foi criar uma proteção contra políticos criminosos ou que lesaram o erário e não honraram os princípios norteadores do cargo público.

Na semana passada, ouvi muitas críticas ao Supremo Tribunal Federal (STF), quando foi decidido que a lei não deve ser aplicada, de forma retroativa, às eleições de 2010.

O voto do ministro Luiz Fux, determinante para o resultado, é bem claro no sentido de que toda lei que altere o processo eleitoral só vale se for aprovada com pelo menos 1 ano de antecedência ao pleito.

A legislação foi feita assim (bem intencionada) para que mudanças feitas ao sabor de conveniências e casuísmos não tumultuem o jogo enquanto ele está sendo jogado.

Aplicar a Ficha Limpa para as eleições passadas seria abrir precedente perigoso para que o jogo eleitoral, sempre bastante obscuro, possa ser alterado em seu transcorrer. Concordo com o que foi definido pelo STF.

Quem criticou pode se preparar, porque, como avisou o ministro Ricardo Lewandowski, a constitucionalidade da lei não foi analisada e acontecerá quando o órgão for provocado, o que deve acontecer.

Mais polêmica: pela Constituição, ninguém pode ser considerado culpado por algum ato, seja crime ou improbidade, enquando a decisão que o condenou não transitar em julgado (sem chance de recurso).

A Lei da Ficha Limpa atual pune quem sofre condenação por um colegiado de juízes e ignora a presunção de inocência garantida pela Constituição. Será um bom debate.

O projeto pode ser declarado inconstitucional, mas a ideia e os objetivos permanecem e devem ser adequados.

A verdadeira proteção por meio da Lei da Ficha Limpa só virá de forma rápida se alterarmos outras coisas.

É preciso mudar a legislação para reduzir a infindável possibilidade de recursos que atrasam o trânsito em julgado ou favorecem o infrator com a prescrição. Evidente que, sendo passível de responderem a ações, políticos podem se beneficiar, em eventuais processos, dessa “teia postergatória” e, por isso, poucos ousam discutir este assunto.

Além desse ponto, é preciso reforçar a estrutura do Poder Judiciário, para que os processos sejam julgados de forma mais rápida, sem prejuízo para ampla defesa.

A mesma iniciativa popular que moveu os ideais da Ficha Limpa pode se movimentar para agir e cobrar nestas duas frentes. Terá meu apoio.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Baú fechado

Texto do jornalista publicado na coluna na versão impressa da edição de 21 de março de 2011:

Os motoristas dão boas-vindas às averiguações que a Promotoria fará em relação aos radares no município.

Além do transporte coletivo, esses equipamentos têm expressiva participação nas reclamações que a redação recebe diariamente da população, motivo pelo qual, sempre que oportuno, e depois da devida checagem, são retratadas neste jornal.

Resolução do Conselho Nacional de Trânsito, de 2006, reforça características educativas que devem estar presentes na instalação de radares.

A justificativa desta norma considera a “necessidade de uniformizar a utilização e medir a eficácia dos medidores de velocidade, com prioridade à educação para o trânsito, à redução e prevenção de acidentes e à preservação de vidas”. Notem: o caráter educativo é o primeiro item elencado.

Não se pode desprezar os radares, pois são importantes “freios” contra a imprudência.

Por outro lado, causa estranheza, como a repórter Érica Samara da Silva mostrou, que a instalação de radares em Limeira, num prazo curto de 1 ano, tenha virado item de necessidade urgente que justifique aumentar de 5 equipamentos para 22.

Cada instalação requer estudo técnico minucioso e, lembremos, com aspectos prioritários de educação. É isso que a Prefeitura terá de explicar ao MP e, por conseguinte, aos motoristas de Limeira.

Outro ponto a ser aprofundado é a aplicação do dinheiro arrecadado pelos radares.

As multas de trânsito em geral renderam aos cofres municipais, entre janeiro e a primeira quinzena de outubro do ano passado, R$ 3,7 milhões, média de R$ 13 mil por dia.

A Prefeitura não divulga balanço de multas faz tempo, mas evidente que os radares têm grande participação nesta arrecadação.

Paralelamente a isso, o setor de agentes de trânsito, responsável pela fiscalização de outros itens de segurança, está visivelmente desestruturado.

O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) diz que todo esse dinheiro tem de ser aplicado em sinalização, engenharia de tráfego, de campo, policiamento, fiscalização e educação no trânsito.

Em 2006, a Prefeitura gastou R$ 132 mil de arrecadação de multas para pagar despesas médicas de servidores da área, o que viola a lei. Tem precedentes, portanto, de aplicação indevida.

Convenhamos: com R$ 13 mil por dia é possível implementar muita coisa em sinalização viária e educação no trânsito.

Os radares, de fato, são um baú fechado que precisa ser aberto aos motoristas de Limeira.

segunda-feira, 14 de março de 2011

De volta à comunidade

Texto do jornalista publicado na coluna na versão impressa da edição de 14 de março de 2011:

O tema da Campanha da Fraternidade proposto pela Igreja Católica neste ano, sobre a vida no planeta, vem num momento oportuno, principalmente para reflexão sobre problemas ambientais em Limeira.

Mal acabou de sair da entrevista em que a Diocese abriu a campanha em nossa cidade, a Gazeta flagrou lixos orgânicos, roupas e móveis, um cheiro insuportável, às margens de uma estrada rural, imagem que estampou a mesma reportagem.

Nas últimas semanas, a situação dos ecopontos deixou de ser absurda para se transformar em algo fora dos padrões de admissibilidade.

A repórter Renata Reis tem buscado mostrar às autoridades e à população os riscos à saúde que esses lixões a céu aberto representam. E não adianta: mesmo com os alertas, passam semanas e os locais permanecem sem fiscalização por parte da Prefeitura e continuam a receber resíduos impróprios despejados por uma parcela da população que não se preocupa com as consequências desse ato, por ignorância ou má vontade mesmo.

Como tudo em Limeira, esse assunto acabou no Ministério Público, quando, na verdade, deveria ser resolvido nas comunidades.

A promotoria é um importante agente da garantia da aplicação da lei, mas, em Limeira, a inércia da sociedade civil em dialogar e agir conjuntamente faz tudo cair em inquéritos, TACs e, em muitos casos, ações civis, depois tachadas, injustamente, de polêmicas, mas que buscam a garantia de direitos na esfera judicial.

O problema dos lixões improvisados e ecopontos pavorosos é da comunidade. Sem forte conscientização, e punição para os que insistem em não se enquadrar às regras, até o promotor Luiz Alberto Segalla Bevilacqua, defensor contumaz do meio ambiente, “enxugará gelo”.

É um trabalho a longo prazo, que envolve atividades específicas em escolas, centros comunitários, associações de bairro, representantes do comércio, de empresas, órgãos estaduais e municipais, enfim, nas comunidades.

As instituições religiosas - a Diocese é uma entre várias - podem ajudá-las nos debates, e este é o grande trunfo do tema escolhido para a Campanha da Fraternidade de 2011: levar a questão do meio ambiente de volta à comunidade.

Problema que está nela e depende de atitude dela para mudar. É um desafio que independe de crença religiosa.

segunda-feira, 7 de março de 2011

Protagonistas da Justiça

Texto do jornalista publicado na coluna na versão impressa da edição de 7 de março de 2011:

Duas sentenças proferidas pela Justiça de Limeira, que viraram tema de reportagens publicadas pela Gazeta na última semana, têm aspectos em comuns e, acima de tudo, reforçam que, independentemente da dimensão do resultado final, as vítimas ainda são os atores principais e devem ser protegidas pela Justiça na violação de um direito ou no sofrimento de um crime.

Num caso, um motociclista foi perseguido por um veículo até ter a trajetória fechada. A ação provocou sua queda e ferimentos que o deixaram incapaz para ocupações habituais por mais de 30 dias - o motorista foi condenado.

Na segunda situação, um homem inconformado com o fim do relacionamento seguia constantemente a ex-companheira, fazendo-lhe ameaças caso ela iniciasse romance com outros - foi condenado. Cabe recurso contra ambas as decisões.

Um fato em comum nos dois casos é o comportamento da vítima.

O motociclista, mesmo ferido, não só teve percepção para gravar as placas do carro como, posteriormente, voltou a Limeira, procurou-o até localizá-lo para juntar as informações que comprovassem o crime de lesão corporal.

No caso da mulher, cansada das perseguições, decidiu levar adiante à polícia e, depois, à Justiça. Ambos foram ativos.

Parte expressiva das mulheres vítimas não representa seus agressores por diversos fatores, assim como muitos acreditam que levar uma fúria no trânsito à Justiça é um enrosco, já que o processo pode se estender por anos, implica gastos com advogados e, ao fim, houver alguma punição, esta acaba em prestação de serviços comunitários ou pagamento de cestas básicas.

Nosso complexo sistema jurídico, com leis que permitem recursos demais, ainda deixa reticências à população, apesar das medidas implementadas nos últimos anos para reduzir a lentidão do Judiciário.

As punições, aos olhos do povo, podem parecer brandas, como, por exemplo, entrega de cesta básica.

Isso é fruto de uma legislação feita por representantes do povo e que os juízes apenas cumprem. Podem ser alteradas caso haja debate sério e pertinente no Congresso.

Enquanto isso não muda, sentenças como as divulgadas por este jornal ganham relevância pelo caráter didático e preventivo, pela demonstração de que fatos comuns a muitas pessoas, mesmo com aparências corriqueiras, têm punição.

São sinais evidentes de que a vítima, sem dúvida, ainda é o protagonista do Judiciário. A este cabe, quando houver fundamentos para tais, protegê-la e determinar o reparo necessário.