Texto do jornalista publicado na coluna na versão impressa da edição de 24 de janeiro de 2011:
“Alegra-te, jovem, na tua juventude”, trecho bíblico que abre o filme “Platoon”, sobre impressões de um ex-combatente no Vietnã, caiu-me, na adolescência, como um recado: eu e outros milhões de jovens tivemos o privilégio de não estar no meio de uma guerra em nossa mocidade.
Assim, fica difícil conceber alguns valores obtidos numa situação mais extrema. Por isso, cuido-me para não banalizar conceitos.
Na semana que passou, os militares, cabo Carneiro e soldado Dalton homenagearam o prefeito Silvio Félix com uma boina, que significa ato heroico, pela ida dele ao Cecap, após a morte de uma mulher no dia 6.
O fato foi divulgado pela Prefeitura e ignorado pela imprensa. Explico porque.
Se heroico é um feito de herói, vou ao dicionário para este último: “alguém capaz de suportar exemplarmente uma sorte incomum (infortúnio) ou que arrisca a vida pelo dever ou em benefício de outro”.
Félix não salvou ninguém naquela noite, nem teve a casa destruída. Como autoridade máxima da cidade, teve espírito humano de solidariedade para acompanhar o drama.
Parabenizemos ele por isso, não por ato heroico.
Ao entenderem como heroísmo a simples ida de uma autoridade ao local da tragédia, depois que ela aconteceu, os militares correm risco de banalizar o próprio ato que fizeram no Haiti, quando, após um terremoto, socorreram flagelados - um deles encarou, com dignidade, a tarefa de fazer a necrópsia de 21 amigos mortos.
Numa época em que valores são facilmente invertidos, perde-se o real significado de conceitos.
Quando Pedro Bial chama os confinados no BBB de “meus heróis”, reforça a ideia de que, em tempos de sobrevalorização de supérfluos, qualquer ato serve para transformar alguém em herói.
Numa tragédia, como a trazida pelas chuvas, os heróis são poucos, e os que querem se vangloriar por tal, são muitos. Autoridades públicas não podem reivindicar heroísmo, porque têm orçamento e caneta na mão para priorizar obras e políticas de habitação em detrimento de torres e redundâncias. Não são vilões, mas tampouco heróis.
Em Nova Friburgo, Rosimeri Moraes de Oliveira, 43, acabava de chegar da maternidade quando o morro veio abaixo e destruiu sua casa.
Sem direito à oração ou choro, em um minuto ela enterrou, numa cova improvisada, a filha de 16 anos e o neto de apenas cinco dias de vida, junto com eles seu sonho de brincar com o neto que não verá crescer.
Ela está, agora sozinha, numa guerra onde o inimigo é a desesperança e, por ora, não há alegria no horizonte.
Peço licença aos militares, à Prefeitura e a Pedro Bial.
Porque Rosimeri é uma heroína.
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